Os avanços nos cuidados médicos têm ajudado a que o parto seja mais seguro, especialmente para as mulheres com gravidezes de alto risco e para os bebés prematuros. As intervenções obstétricas como o cateter intravenoso (IV), o monitor fetal electrónico, condução do trabalho de parto e a anestesia epidural são rotinas em muitos hospitais. No entanto, as investigações não têm demonstrado que o uso rotineiro destas intervenções melhore os resultados do parto em todas as mulheres. Assim, as investigações sugerem que a menos que exista uma indicação médica clara para realizar uma intervenção, interferir com o processo natural do trabalho de parto e parto não é provavelmente benéfico, e que na realidade pode ser prejudicial. As intervenções podem ser tão simples como a separação das mães e dos seus bebés imediatamente após o parto, ou complexas como o uso contínuo do monitor fetal para um trabalho de parto normal.
Restrições na ingestão de alimentos e líquidos Restringir os líquidos e alimentos durante o trabalho de parto é uma tradição obstétrica amplamente aceitada. Começou aproximadamente há 50 anos, quando as mulheres davam á luz sobre anestesia geral, sem protecção das suas vias aéreas. A tradição está baseada na crença de que o jejum reduz os conteúdos no estômago e por tanto, a possibilidade que os conteúdos gástricos entrem nos pulmões por aspiração, se uma mulher vomita enquanto se encontra sob o efeito da anestesia. Todavia as técnicas de anestesia têm melhorado significativamente nos últimos 50 anos. A anestesia geral praticamente desapareceu na obstetrícia moderna, a aspiração dos brônquios é muito raramente utilizada na anestesia moderna, nenhum período de jejum garante um estômago vazio e claro, os líquidos de limpeza actuam no estômago quase de imediato. Por estas razões, muitos profissionais de saúde optam por não restringir os alimentos e líquidos durante um normal trabalho de parto. A Sociedade Americana de Anestesiologistas (ASA) e o Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologistas (ACOG) recomendam que sejam dados líquidos apropriados ás mulheres de baixo risco, em trabalho de parto. As Parteiras frequentemente recomendam snacks suaves e líquidos, de forma a fornecer energia á mulher. A Sociedade de Obstetrícia e Ginecologia do Canadá refere que "á mulher em trabalho de parto deverão ser oferecidos líquidos suaves ou dietéticos". O "The Cochrane Pregnancy and Childbirth Group" recomenda a ingestão de alimentos suaves, fracos em gorduras durante o trabalho de parto. Anestesiologistas têm conduzido estudos sobre a segurança de comer durante o trabalho de parto. A tradição de restringir a ingestão de alimentos ou líquidos mudou, visto que novas evidências e novas técnicas médicas emergiram.
O uso de Líquidos Intravenosos A terapia intravenosa (IV) tem sido utilizada de forma rotineira para prevenir a desidratação nas mulheres, ás quais restringem a ingestão de alimentos e líquidos, e para prover o acesso rápido à veia em caso de emergência. Todavia o uso do soro intravenoso em todas as mulheres em trabalho de parto tem sido questionado. As emergências que ameaçam a vida são muito raras em partos de baixo risco, as soluções intravenosas não proporcionam nem a nutrição, nem energia que oferece a comida e os líquidos, algumas mulheres acham a canalização dolorosa e stressante, para além de que os soros dificultam a mudança de posição e o livre movimento da mulher. De acordo com a base de dados Cochrane, o uso rotineiro do soro intravenoso é improvavelmente benéfico. Se o trabalho de parto é induzido, ou acelerado, se se aplica a anestesia epidural ou se se proíbe de tomar líquidos e/ou comer, a solução intravenosa é necessária.
Monitorização Fetal Electrónica Contínua A frequência cardíaca do bebé pode ser monitorizada quer seja por auscultação (escutando com um Doppler ou estetoscópio) ou por um Monitor Electrónico Fetal (MEF). O MEF pode-se realizar continuamente ou de forma intermitente. Um exemplo de monitorização electrónica intermitente é quando a mulher é monitorizada por 20 minutos, em cada hora, e se retira nos restantes 40 minutos, enquanto que o monitor está desligado a mulher tem liberdade para se movimentar e utilizar técnicas de alívio e conforto como a banheira ou o duche. O uso do MEF contínuo restringe a habilidade da mulher para mover-se e mudar de posição, ou seja, fica restringida á cama. As recomendações da monitorização por auscultação dependem de se o trabalho de parto é de alto ou baixo risco. Para um trabalho de parto de baixo risco, os peritos recomendam que se escutem os batimentos cardíacos do bebé em cada 30 minutos durante o trabalho de parto activo, e em cada 15 minutos, durante a segunda fase. Num trabalho de parto de alto risco em cada 15 minutos e 5 minutos respectivamente. 7,8
De acordo com ACOG e a Association of Women´s Health, Obstetric and Neonatal Nurses (AWHONN) as mulheres sem complicações podem ser monitorizadas quer seja por auscultação intermitente, quer por MEF intermitente. 7,8 Os estudos que comparam a auscultação com o MEF revelam que não há diferença nos resultados para o bebé. No entanto, as mães a que se aplicou o MEF tiveram maior número de cesarianas. 4 ACOG sugere usar a auscultação intermitente em lugar do MEF como uma forma de diminuir o índice de cesarianas. Converse com o seu médico sobre o uso de auscultação ou de MEF intermitente em lugar do uso contínuo. 4 Todavia, se tiver alguma complicação médica, se o seu trabalho de parto for induzido, ou acelerado artificialmente, se lhe é dada uma epidural, ou se surge algum problema durante o trabalho de parto, a monitorização electrónica fetal torna-se necessária.
Acelerar o trabalho de parto: RupturaArtificial de Membranas e condução
Não permitir que o trabalho de parto se alargue demasiado pode soar atractivo, mas interferir com o ritmo e a duração do trabalho de parto sem nenhuma indicação médica não é benéfico. Cada trabalho de parto é único e influenciado por um número de factores, incluindo o tamanho, a posição do bebé, a possibilidade de a mulher em trabalho de parto mover-se livremente, a confiança que a mulher sente quando é devidamente apoiada e continuamente. Romper a bolsa de águas (ruptura de membranas) pode encurtar o trabalho de parto mas existem desvantagens. 4
O saco amniótico, ou bolsa de águas que rodeia o bebé protege-o de infecções e da pressão enquanto se move pelo canal de parto. Estudos sugerem que quando as membranas se rompem numa fase inicial do trabalho de parto, o índicede cesarianas aumenta. 10 A ruptura prolongada das membranas associa-se com um alto risco de infecções tanto para a mãe como para o bebé, na verdade, o relógio começa a contar uma vez que a bolsa se rompe. Se o trabalho não progride, quem lhe estiver a atender no parto pode sugerir o uso artificial de oxitocina para acelerar o trabalho de parto. No trabalho de parto natural, a oxitocina é liberta pelo cérebro. Quando a oxitocina alcança um nível elevado, as endorfinas são segregadas. Endorfinas, hormonas naturais do corpo, que reduzem a dor, e ajudam a mulher a enfrentar a dor do trabalho de parto. A oxitocina artificialmente administrada através soluções intravenosas, não chega até ao cérebro, pelo que, não causa a libertação de hormonas redutoras da dor, as endorfinas. A oxitocina altera também o trabalho de parto de várias formas. As contracções das mulheres que foram administradas oxitocina são mais fortes, longas e frequentemente mais dolorosas. Se se administrou oxitocina, a mulher necessita de outras intervenções como o soro e a monitorização contínua. Com a oxitocina usualmente a mulher fica confinada á cama, sem a comodidade do movimento ou outras. Contracções mais fortes, perda de endorfinas e impossibilidade de usar medidas de conforto e alívio da dor, aumentam a possibilidade de que a mulher necessite de anestesia epidural. De acordo com Cochrane Pregnancy and Chilbirth Group, "permitir que as mulheres se movimentem, comam e bebam líquidos, conforme elas desejarem, será no mínimo tão eficaz e mais agradável para a maioria das mulheres consideradas para a aceleração do trabalho de parto. As investigações sugerem que a amniotomia (ruptura artificial das membranas) e a condução com oxitocina, deverão ser reservadas para aquelas mulheres com um real anormal progresso do trabalho de parto. 10 Estas práticas não deverão ser praticadas rotineiramente.
Anestesia Epidural A maioria das mulheres tem medo da dor do parto e anseiam pela utilização de medicamentos para a dor, especialmente quando o medicamento é tão efectivo como o bloqueio epidural para aliviar a dor. Em alguns hospitais é administrada a anestesia epidural a mais de 90% das mulheres durante o trabalho de parto. Num inquérito realizado nos EUA, 60% das mulheres responderam ter recorrido á epidural. Contudo, entre 26% e 41% destas mulheres ignoraram os efeitos colaterais desta anestesia. 11 Com o bloqueio epidural, os músculos da pélvis relaxam-se tanto, que pode levar mais tempo ao bebé, a rodar e descer através do canal de parto. A ausência da dor pode interferir com a libertação natural de oxitocina e pode levar á necessidade de estimular o trabalho de parto com oxitocina artificial. Como o fármaco utilizado na epidural pode causar quebra de tensão arterial na mulher em trabalho de parto, o uso de fluidos através de soros intravenosos antes e durante a anestesia são recomendados. Também devido á probabilidade de diminuição da pressão arterial, o uso de monitor fetal contínuo é necessário. As alterações fisiológicas no trabalho de parto e parto, e as intervenções requeridas para assegurar a segurança da mãe e do bebé durante uma anestesia epidural estabelecem o cenário para um número de possíveis efeitos não intencionados. Os estudos demonstram que o bloqueio epidural está associado com um índice mais baixo de partos vaginais, com um índice mais elevado de partos instrumentalizados (ventosa e fórceps), e com trabalhos de partos mais prolongados, particularmente em mulheres que vão ter o primeiro filho. Os estudos mostram também que as mulheres a quem se administrou a epidural têm uma taxa mais alta de febre durante o trabalho de parto. Como resultado, o bebé pode necessitar de realizar análises e tratamento contra uma possível infecção, causando a separação entre mãe e bebé. 12 Existe evidência de que o uso de anestésicos epidurais, especialmente para prímigestas, aumenta a taxa de nascimentos por cesariana. 13 Faz sentido avaliar cuidadosamente os riscos e os benefícios da anestesia epidural antes de tomar uma decisão pessoal. Cada trabalho de parto é único. Se o seu trabalho de parto é anormalmente longo e está cansada, o uso da epidural pode proporcionar descanso e ser benéfico. Existem de igual forma, indicações médicas para a aplicação da anestesia epidural, como por exemplo, uma cesariana. Se está activa no trabalho de parto, tem liberdade de movimento e tem acesso a outras formas de alívio e conforto, é menos provável que necessite de uma epidural, e que a requeira numa fase precoce do trabalho de parto, ou que necessite de uma grande quantidade de medicamento. Caso seja solicitada, uma dose menor do medicamento, e aplicada mais tardiamente no trabalho de parto, permitirá que se elimine antes que se inicie a fase de expulsão e reduzir assim a quantidade de efeitos não desejados.
Recomendações de Lamaze Internacional Lamaze Internacional recomenda que evite as restrições para comer e beber, que comente com o seu médico o uso de soluções intravenosas, o MEF contínuo, a ruptura artificial das membranas (amniotomia), a condução do trabalho de parto e a anestesia epidural. Procure que só sejam utilizadas quando exista indicação médica. Lamaze Internacional recomenda-lhe que tenha confiança na sua própria habilidade para dar á luz sem intervenções de rotina. Eleja cuidadosamente o pessoal de saúde que atenderá o parto, assim como o lugar para o nascimento, assegurando-se que utilizam estas intervenções só em caso de serem medicamente necessárias.
Referências 1. American Society of Anesthesiologists Task Force.(1999). Practice guidelines for preoperative fasting and the use of pharmacologic agents to reduce the risk of pulmonary aspiration: Application to healthy patients undergoing elective procedures. Anesthesiology, 90(3), 896–905.
2. American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG). (2002). ACOG practice bulletin: Obstetric analgesia and anesthesia. Obstetrics & Gynecology, 100(1), 177–191.
3. Society of Obstetricians and Gynecologists of Canada (SOGC). (1998). Healthy beginnings: Guidelines for care during pregnancy and childbirth. Retrieved from http://www.sogc.medical.org/ SOGCnet/sogc_docs/common/guide/library_ e.shtml#obstetrics
4. Enkin, M., Kierse, M.J., Neilson, J., Crowther, C., Duley, L., Hodnett, E., et al. (2000). A guide to effective care in pregnancy and childbirth. New York: Oxford University Press.
5. Kubli, M., Scrutton, M.J., Seed, P.T., & O’Sullivan, G. (2002). An evaluation of isotonic "sports drinks" during labor. Anesthesia & Analgesia, 94(2), 404–408.
6. Begum, M. (1999). In B. Sengupta et al. (Eds.), Obstetrics for Postgraduates and Practitioners. New Delhi: BI Churchill Livingstone.
7. American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG). (1995). Fetal heart rate patterns: Monitoring, interpretation, and management. ACOG Technical Bulletin (No. 207). Washington, DC: ACOG.
8. Feinstein, N.F., Sprague, A., & Trépanier, M.J. (2000). Fetal heart rate auscultation. Washington, DC: Association of Women’s Health, Obstetric and Neonatal Nurses (AWHONN).
9. American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG). (2000). Evaluation of cesarean delivery. Washington, DC: ACOG.
10. Fraser, W., Turcot, L., Krauss, I., & Brisson- Carrol, G. (2003). Amniotomy for shortening spontaneous labour (Cochrane Review). In The Cochrane Library (Issue 2). Oxford: Update Software.
11. Declerq, E., Sakala, C., Corry, M., et al. (2002). Listening to mothers: Report of the First National U.S. Survey of Women’s Childbearing Experiences. New York: Maternity Center Association.
12. Lieberman, E., & O’Donoghue, C. (2002). Unintended effects of epidural analgesia during labor: A systematic review. Supplement to American Journal of Obstetrics and Gynecology, 186 (5): S31–S68.
13. Howell, C.J. (2003). Epidural versus nonepidural analgesia for pain relief in labor. (Cochrane Review). In The Cochrane Library (Issue 3). Oxford: Update Software.
Elaborado pelo Conselho de Educação do Instituto Lamaze